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Cronica e arte

CRONICA E ARTE  CNPJ nº 21.896.431/0001-58 NIRE: 35-8-1391912-5 email cronicaearte@cronicaearte.com.br Rua São João 869,  148882-010 Jaboticabal SP
O PAR DE ÓCULOS Por Mentore Conti O mês deveria ser outubro, o ano e a data exata se perdem na poeira do tempo. O pouco frio que tinha feito na região, tinha terminado e o clima ficaria cada vez mais quente, até o inverno seguinte.  Mário como os demais amigos eram italianos, ele propriamente era da Itália. A terra distante que deixou para emigrar, a profissão de professor de matemática que deixou para trás, …  Agora a família os filhos, a nova esposa com a qual casou mais para ajudar a criar as crianças, já que a primeira mulher morreu no parto. A nova profissão que assumira de pedreiro, ... A vida era difícil naquela época.  Mário quando podia ir na barbearia de Berto, ... O Berto barbeiro Como era conhecido pelos fregueses.  Mário quando conseguia, ia visitar o amigo A barbearia ficava em uma sala na frente da casa e na sequência daquele casa do Berto, tinha uma sala com uma mesa grande e a sala que dava para outros quartos, para a cozinha. Era um período em que os descendentes de italianos iam conseguindo trabalhos melhores. No início os italianos tinham chegado como imigrantes para substituir os escravos e, no dia-a-dia, muitos conviveram ainda com os escravos e com a mentalidade escravista dos antigos coronéis. Agora já amenizara um pouco o problema. A igreja criou no asilo daquela cidade, um serviço de creche, onde os filhos de italianos, ou seus netos, enquanto os italianos trabalhavam, tinham onde ficar. Mário sentia que vagarosamente algo parecia mudar. Seu filho que foi pedreiro junto com ele, tinha ido para São Paulo, ingressou na Força Pública. Um filho de imigrante agora era funcionário público na Terra Nova, que o tinha acolhido, que tinha acolhido Mário. Quantas vezes Mario chegou na casa de Berto barbeiro e com orgulho de imigrante dizia: Marinho, Marinho está bem... Marinho agora trabalha com a segurança do Governador!!! Vedi dove siamo arrivati! Il mio filho Em São Paulo…  Está bem…  Come pão com manteiga todo dia, ...tem um guarda-roupas com três repartições, ... está bem! Mário andava preocupado já há alguns dias. A filha mais velha do Berto barbeiro estava com problema de vista, Não enxergava bem…  Talvez astigmatismo…  Logo ela que gostava de estudar, logo ela, que como ele na Itália, queria ser professora. O que fazer…  A consulta com oculista era cara e ele sabia do aperto de todos os italianos e seus descendentes, ou da maioria deles, ... sabia das dificuldades do amigo. Dinheiro eles tinham, mas uma consulta, mais o preço dos óculos era muito alto…  Mário estava preocupado, Berto também, ainda que não falasse, ...também estava. Ser professora não era um sonho somente da menina, mas de um grupo de italianos, que agora começava a despontar na cidade.  Finalmente eles os chamados “carca mano” estavam começando a emergir. Ele já não eram mais colonos, agora um era barbeiro, outro dono de bar, ele Mário pedreiro, ...o filho... o filho de Mário, na Força Pública. Agora era a vez da filha do Berto, do Berto barbeiro. A menina não enxergava direito, ...E agora ...o que eles podiam fazer?  Berto o Barbeiro andava preocupado, ... Mário estava preocupado pelo amigo… Um dia Mário caminhava pela rua quando ele vê jogado na calçada, um par de óculos, uma armação entre o amarelo e o bege, um tom de marrom e as lentes. Mário não teve dúvidas procurou saber se alguém tinha perdido aqueles óculos. Ao ficar sabendo que eram óculos velhos e descartados pelo dono, Mário guardou o objeto e esperou para ir até o salão, na casa de Berto barbeiro. Na quinta-feira daquela semana, Mário chega na barbearia com a novidade: --- seu Berto o senhor não indovina o que encontrei!!  Berto barbeiro era um descendente de calabrês e mesmo com os amigos não era muito calmo e já foi dizendo: --- Mà dice de uma vez!!! ... desembucha, como fala o povo quando alguém fica enrolando!  Mário Então tira do bolso os óculos e diz, risonho, que tinha achado a solução para filha de Berto e disse que eles fariam um teste colocando os óculos a menina e se, ela lesse um cartaz, um texto, o óculos serviriam. De início o barbeiro teve vontade de rir, mas depois entre uma tesourada e outra no cabelo do freguês que estava atendendo, pensou bem e disse consigo mesmo Está bom, e porque não ???!!! Berto logo pensou que diferença fazia em ir pagar um exame em um oculista, ou testar os óculos na menina, com ela vendo um cartaz. Se ela enxergasse bem com óculos, tudo bem... daria certo. ---Está bom Mário, disse o Barbeiro, espera ali na sala que terminando este freguês eu já vou.  Mário chega na sala e diz: Dona Rosa, tudo bem? --- tudo bem Seu Mário, ... o senhor quer um café? --- sim respondeu Mário, mas Dona Rosa já foi falando: ---- pois é mas café não tem!!! mas se o senhor preferir uma limonada… ---Há uma limonada vai bem com este calor, disse Mário.  E Dona Rosa lhe responde: ---Ah sim, mas limonada também não tem!!! No final Dona Rosa trazia um Pouco d'água para a visita. Ela sempre fazia isto e falava assim, talvez um jeito de brincar um pouco e esquecer das dificuldades que, naquela época atingia os italianos e seus descendentes. As visitas levavam no bom humor, principalmente quando se tratava de algum Calabrês ou de algum descendente de italiano do sul da Itália. Esta alegria toda, mesmo naquela situação e os porquês daquelas brincadeiras se perdem no tempo... Alguns minutos depois Berto que em geral era rápido em cortar um cabelo, estava ali rindo e conversando um pouco. Quando a filha de Berto chegou da escola, O barbeiro e seu Mário puseram em prática a ideia do exame de vista caseiro. ---Maria!!!! exclamou Mário, se dirigindo a filha de Berto que naquela época tinha cerca de 8 anos um pouco mais de 8 anos e gostava da ideia de usar óculos. Quando o Barbeiro e Mário lhe propuseram fazer o teste para ver se os óculos serviam, mais do que depressa a menina aceitou. ---Pega o cartaz da quermesse de Aparecida, disse o Berto referindo-se ao cartaz que estava no salão de barbeiro, anunciando os festejos da santa. E assim foi feito, o cartaz foi colocado na parede e Maria com os óculos leu os dizeres. Nem precisaria falar que a menina não ficou distante do cartaz como seria natural em um exame de vista. Com cartaz nas mãos, ela leu novamente. Mas para que ler a distância, se uma pessoa quando lê, põe um livro perto do rosto pensou o Barbeiro. Sua filha ficou contentíssima, Ela sonhava com um par de óculos, Ah e aquela cor entre o amarelo e o bege, ela ia parecer professora.  Maria sempre gostou de brincar de escolinha e seus alunos eram pedaços de lenha que ela punha como que sentados, para ensinar a lição Dizer que ela continuou sem enxergar direito, não é preciso falar! Ah era uma época difícil, mas anos depois, 11 anos depois, com muito sacrifício Maria se formou professora, Para alegria de Berto barbeiro que não quis ser seu padrinho de formatura, por que não aguentaria a emoção.  Berto barbeiro chorou de emoção, a sua filha fazia parte daquela primeira geração de italianos, que estava progredindo e tendo trabalhos antes só ocupados por parentes de fazendeiros de origem portuguesa ali na região. E foi então que Maria finalmente, já professora, pode ter um par de óculos, agora sim com exame correto, que realmente lhe servissem.